A Justiça Federal estendeu até o fim de 2021 o pagamento do auxílio emergencial mensal para pescadores e agricultores de subsistência de diversas cidades afetadas após a tragédia de Mariana (MG). Em 2022, ele será substituído por um vale alimentação em data a ser definida em juízo.
O auxílio emergencial mensal é uma das medidas previstas no termo de transição e ajustamento de conduta (TTAC), acordo de reparação assinado após o rompimento da barragem da Samarco, ocorrido em novembro de 2015. A tragédia levou à morte 19 pessoas, ocasionou destruição em comunidades e causou poluição em dezenas de municípios na bacia do Rio Doce.
Conforme o acordo, todas as pessoas que tiveram suas atividades econômicas interrompidas em decorrência do episódio devem receber o auxílio emergencial. A quantia é de um salário mínimo, acrescido de 20% para cada dependente, além do valor de uma cesta básica. Os pagamentos são feitos pela Fundação Renova, entidade que foi criada para administrar todas as ações de reparação financiadas pela Samarco e por suas acionistas Vale e BHP Billiton. O auxílio emergencial não se confunde com a indenização individual por danos morais e materiais, cujo cálculo é feito separadamente.
No ano passado, a Fundação Renova questionou os repasses para pescadores e agricultores de subsistência. São categorias que não tiveram perda de renda, mas prejuízo na produção pra consumo próprio. Assim, a entidade chegou a anunciar a suspensão dos pagamentos a esses grupos, argumentando que eles não fariam jus ao auxílio emergencial.
Em julho de 2020, o juiz Mário de Paula Franco Júnior reconheceu a omissão do TTAC em relação aos pescadores e agricultores de subsistência, mas proibiu a realização de cortes repentinos no benefício. O magistrado estabeleceu um regime de transição para um vale alimentação, que começou neste mês com a redução do auxílio emergencial pela metade, ficando em uma média de R$ 900.
Estava previsto para julho deste ano uma mudança na natureza dos pagamentos. Pescadores de subsistência passariam a receber mensalmente valor correspondente ao kit de proteína da cesta básica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Já os agricultores de subsistência teriam direito ao valor integral da cesta básica. Mas em novo despacho divulgado ontem (19), Mário de Paula considerou que os efeitos da pandemia de covid-19 foram mais adversos do que imaginado e adiou a transição para 2022.
“Os atingidos, mesmo com a promessa de chegada da vacina e retorno às condições normais da vida em sociedade, ainda não tiveram o tempo necessário (e suficiente) para se adequarem e se adaptarem à nova realidade”, escreveu o magistrado.
Em nota, a Fundação Renova afirma que a decisão judicial reconhece que “a concessão do auxílio financeiro emergencial para quem sofreu um dano na atividade de pesca de subsistência ou agricultura para consumo próprio está em desacordo com o estipulado no TTAC”. De acordo com a entidade, até dezembro de 2020, foram pagos R$ 3,07 bilhões em indenizações e auxílios financeiros para cerca de 320 mil pessoas.
Veto à corte unilateral
Na mesma decisão, o juiz reiterou que a Fundação Renova está proibida de efetuar cortes unilaterais nos benefícios. O entendimento já havia sido adotado em decisão do ano passado. Não foram apenas pescadores e agricultores de subsistência que foram surpreendidos em 2020 com o anúncio de suspensão do pagamento. Em julho, a entidade divulgou um comunicado informando que o benefício passaria a ser restrito a alguns grupos.
A Justiça, no entanto, determinou a manutenção dos pagamentos. No TTAC, ficou definido que o cancelamento do auxílio emergencial não pode ocorrer antes que as atividades produtivas tenham se restabelecido. O juiz Mário de Paula considerou que não cabe a Fundação Renova, de forma unilateral, decidir se a situação dos atingidos já foi normalizada. A avaliação da entidade deverá ser corroborada pela própria Justiça ou pelo Comitê Interferativo, estrutura que também foi criada a partir do TTAC para fiscalizar as ações de reparação dos danos da tragédia. Ele é composto por diversos órgãos públicos sob a coordenação do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
“O restabelecido das condições para retomada das atividades produtivas ou econômicas é critério técnico e deve ser atestado, validado, em análise avaliada e aprovada pelo Comitê Interferativo e, havendo dissenso, pelo Poder Judiciário”, registra a decisão.
Nos casos em que houver indícios de fraude para recebimento do pagamento, a decisão estabelece a necessidade de se estabelecer um rito procedimental, no qual exista espaço para a defesa do beneficiário.
“A Fundação Renova não só pode, mas deve, coibir a prática de fraudes e ilícitos em todos os programas que estão sob sua responsabilidade. Entretanto, deve sempre instaurar um procedimento específico, individualizado, com um mínimo de contraditório, notificando previamente o suposto interessado para apresentar esclarecimentos sobre as situações apontadas. Ademais, eventual suspensão/cancelamento deve ser objeto de decisão individualizada, fundamentada, especificando os motivos que levaram ao corte.”
As informações são da Agência Brasil