Clã do Golfo: como o maior grupo criminoso da Colômbia se tornou alvo dos EUA e ameaça a negociação de ‘paz total’


A inclusão do Exército Gaitanista da Colômbia — conhecido como Clã do Golfo — na lista norte-americana de organizações terroristas reacendeu um debate sobre segurança regional e coloca em xeque as negociações de paz conduzidas em Bogotá. A medida aumenta a pressão sobre um grupo que, embora nascido de remanescentes paramilitares, atua hoje como um conglomerado criminoso com ramificações além das fronteiras colombianas.


Origem e estrutura

O Clã do Golfo surgiu a partir da recomposição de atores armados da década de 1990, quando ex-combatentes de diferentes matrizes se reorganizaram em uma entidade voltada ao lucro e ao controle territorial. A organização desenvolveu um modelo de operação híbrido: parte de sua base funciona como um exército regular, enquanto outra parcela opera em redes de apoio urbano e rural, com estruturas quase empresariais que permitem terceirizar atividades e repor quadros rapidamente.


Estudos independentes apontam que o grupo possui milhares de integrantes e mantém presença ampla no território colombiano — em centenas de municípios —, o que facilita a infiltração em economias locais e a captação de recursos por meio de crimes como extorsão, tráfico de drogas, migração irregular e mineração ilegal.

Atividades e alcance territorial

Ao longo da última década, o Clã do Golfo expandiu sua atuação em zonas estratégicas para o narcotráfico e outros negócios ilícitos: regiões como Urabá, Bajo Cauca, Córdoba, norte do Chocó e trechos do Magdalena Medio e de Bolívar aparecem com frequência em relatórios sobre presença do grupo. Além disso, redes de atuação internacional já resultaram em apreensões e prisões em países da América do Sul e Europa.

A diversificação econômica foi decisiva para sua resiliência. Em momentos de crise, a organização migrou recursos para atividades como contrabando de pessoas e mineração, estabelecendo alianças locais que ampliaram sua base social e financeira.

Liderança e sucessão

No passado recente, a liderança foi concentrada em figuras conhecidas que forçaram respostas cadastrais e operações policiais. A captura e extradição de um líder de alto escalão para os Estados Unidos produziram um vácuo que foi parcialmente preenchido por novos comandantes, processo marcado por violência e disputas internas. A capacidade de o grupo substituir rapidamente chefes e adaptar rotas de atuação é apontada como fator chave para sua longevidade.

Negociações com o Estado e riscos externos

O governo colombiano incluiu o Clã do Golfo em sua agenda de diálogo na tentativa de reduzir a violência e recuperar territórios. Para o poder público, negociar com uma organização com forte inserção criminosa é um dilema: por um lado, há a possibilidade de diminuir conflitos; por outro, cresce a preocupação sobre a legitimidade e os resultados de acordos com atores que lucram com atividades ilícitas.

A decisão dos Estados Unidos de classificar o grupo como organização terrorista adiciona novas camadas de complexidade: além de ampliar sanções e ferramentas legais contra líderes e redes de apoio, pode abrir caminho a operações externas que atinjam solo colombiano, cenário que Brasília e Bogotá observam com preocupação por seu potencial de escalada regional.

O que muda na prática

Na prática, a designação tende a dificultar conversas diplomáticas e a restringir canais financeiros e logísticos utilizados pelo grupo. Também favorece perseguições internacionais e a cooperação policial entre países. Para comunidades locais, no entanto, a medida pode trazer consequências ambíguas: sem presença estatal reforçada, vazios de poder costumam ser ocupados por outras facções ou por estruturas criminosas locais.

Enquanto isso, especialistas apontam que a solução para a questão exige uma combinação de ações — presença institucional permanente, políticas sociais nas áreas afetadas e iniciativas coordenadas com países vizinhos —, sob o risco de que a resposta apenas militarize ainda mais um problema multifacetado.

Resumo: o Clã do Golfo é hoje muito mais que uma organização armada: é uma rede criminal com enraizamento territorial e capacidade de adaptação. A inclusão na lista norte-americana altera o jogo político e operacional, mas não substitui a necessidade de estratégias integradas para reduzir a violência e enfraquecer os mecanismos que sustentam o crime organizado na região.